Em menos de trinta anos desde a estreia do Toyota Prius, o automóvel híbrido transformou‑se no protagonista absoluto do mercado japonês. Dados compilados pela Bloomberg mostram que, em 2022, os motores a gasolina ainda respondiam por 51,1 % das vendas, contra 42,6 % dos híbridos.
As projeções na época indicavam uma inversão tímida para 2023, mas o salto foi maior do que o esperado: os híbridos chegaram a 55 % dos 2,7 milhões de carros emplacados — 1,5 milhão de unidades —, enquanto a participação da gasolina despencou para 36 %.
Um mercado singular e as consequências para os fabricantes
Os estudos da Bloomberg apontam que essa diferença tende a aumentar. Até 2030, 67,1 % dos veículos vendidos no Japão deverão ser híbridos, e menos de um quinto usará apenas motores a combustão. Os elétricos puros, apesar do avanço em outras regiões, devem ocupar cerca de 10 % do mercado japonês, número modesto quando comparado aos mais de 30 % previstos para a Europa — algumas análises chegam a projetar mais de 50 % no Velho Continente e cerca de 40 % nos Estados Unidos.
A peculiaridade japonesa ajuda a explicar a cautela de Toyota, Honda, Nissan e Mazda na eletrificação total. O perfil de consumo local favorece carros compactos, práticos por dentro, mas que ainda não foram plenamente contemplados pelas opções elétricas disponíveis. Além disso, a infraestrutura de recarga é considerada escassa e o custo dos elétricos continua elevado, fatores apontados pelo ex‑executivo da Mitsubishi Kenichiro Wada como barreiras‑chave.
Outro elemento cultural reforça essa tendência: os compradores japoneses priorizam marcas nacionais — e, até agora, a oferta de elétricos locais é limitada e com desempenho de vendas tímido. O resultado sustenta a estratégia das montadoras de prolongar o investimento em híbridos enquanto aguardam um amadurecimento do mercado elétrico global.
Executivos da Toyota, por exemplo, teriam se mostrado surpresos, no Salão de Xangai, com a rapidez dos avanços chineses, mas defendem que híbridos com baterias capazes de agregar valor real ao cliente continuam sendo o caminho mais seguro no curto e médio prazo.
A comparação com a Europa evidencia outras particularidades. No continente europeu, a queda do diesel, impulsionada por preocupações ambientais, abriu espaço para os elétricos; no Japão, medidas adotadas no fim dos anos 1990 reduziram o diesel de 20 % das vendas em 1999 para apenas 1 % em 2015, eliminando parte dessa pressão.
Com exigências ambientais cada vez mais rígidas em mercados externos, especialistas ouvidos pelo The New York Times avaliam que o híbrido pode se tornar a única forma viável de manter motores a combustão nas próximas décadas — cenário que validaria a postura prudente da indústria automobilística japonesa.